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Foto do escritorSilvio Bianchi

Armadilhas financeiras. Quem engana a quem?

O endividamento e a inadimplência não dão descanso. A última pesquisa da CNC (PEIC – out/22) mostra que o endividamento se mantem estável, mas as dívidas em atraso aumentaram.


Muitos olham as suas contas, especialmente para a fatura do cartão de crédito (que podem ser várias) e ao saldo da utilização do cheque especial e se perguntam: “por que cheguei nesta situação?”



Na maioria das vezes, esta pergunta é respondida de uma forma muito popular: um(a) responsável!

  • A pandemia;

  • Os impactos econômicos da pandemia;

  • O fato “A”, “B”, “C” ou “D” que obrigaram a gastar X Reais;

  • Os juros, que continuam em elevação;

  • A inflação e o aumento no preço dos alimentos e do combustível;

  • O banco “tal” ou a financeira “qual”, que ficam com quase todo o salário;

  • Outros responsáveis...

Porém, essas respostas, verdadeiras, na maioria das vezes, não ajudam a enxergar a luz no fim do túnel.


Conhecer a causa do que está acontecendo é importante, mas é necessário ir além. Após o ocorrido, é necessário realizar duas ações: resolver a situação criada e se precaver para não voltar a acontecer.



A HISTÓRIA DA ALICE


Alice, nome fictício de uma cliente real, sempre decidiu suas compras “no momento”, sem avaliar muito se precisava disso (compra por impulso) ou se cabia dentro do seu orçamento. Seu único limite era o limite de crédito do cartão que, aliás, representava várias vezes seu salário líquido.


Quando Alice percebeu que não iria conseguir fazer o pagamento total da fatura do cartão, fez um empréstimo consignado “a perder de vista”, pagou a fatura íntegra e decidiu que, a partir do mês seguinte, reduziria suas compras um 50%. Essa noite foi a dormir bem tranquila!


Porém, as tentações continuaram aparecendo e ela cedendo. Isso resultou na necessidade de conseguir um novo empréstimo para poder fazer o pago total da fatura seguinte e não “ser vítima dos juros abusivos do cartão”, ela disse. O banco também decidiu ajudá-la, elevando seu limite de crédito no cartão, mas ela não recebeu uma notificação formal.


Chega o próximo vencimento e ela não consegue pagar a totalidade da fatura, percebe que seu limite de crédito foi aumentado e... fica muito brava com o banco por não a ter informado desse aumento no limite do cartão.


Pareceria ser que esta história tem duas personagens e a armadilha: Personagem 1: a instituição financeira/banco (geralmente conhecida como “o vilão”); Personagem 2: a cliente endividada (geralmente conhecida como a vítima); e A armadilha: o crédito (nas suas diferentes formas).

A instituição financeira

Todos os dias, atendemos pessoas que declaram ter sido iludidas/enganadas pelo funcionário do banco, que lhe disse o que esperava ouvir, que fez muitas promessas e que, no final, somente acabou aumentando sua dívida.


Porém, ao perguntar se entendeu a proposta ou se leu a letra pequena do contrato de empréstimo, responde que “estava com muita pressa, aceitei e deixei para fazer depois”.


Sabemos que as instituições financeiras não são santas, porém, também sabemos que o negócio delas é emprestar dinheiro!


Assim como o pastor não deveria consultar o lobo quando o assunto é proteger suas ovelhas dos lobos, tampouco se deveria consultar ao banco e ficar com a primeira proposta que se recebe dele quando o assunto é parcelar uma dívida ou contratar um crédito. O cliente endividado

Associado, na maioria das vezes, ao papel de vítima, o cliente é o ator principal desta história.


Preocupado com o risco de ficar com o nome sujo, sem enxergar formas para sair do endividamento, ciente de que as taxas de juros são absurdamente elevadas, com rendimentos insuficientes para cobrir suas despesas básicas e pagar as dívidas e pressionado pelos credores, o cliente endividado quase sempre decide contratar um novo crédito “para resolver a situação” sem avaliar o impacto dessa nova parcela no seu orçamento mensal.


Quando uma decisão é tomada para resolver um problema específico, mas sem avaliar seus custos e benefícios, nas finanças comportamentais isso se chama: decidir dentro do túnel da escassez. Esta decisão é tomada por impulso.


A probabilidade dessa resolução acabar complicando mais a situação da pessoa é muito alta. Porém, ao não dar certo, a responsabilidade cai sobre a instituição financeira.

O crédito[1]

É a ferramenta mais desejada, muito utilizada e que a grande maioria das pessoas não sabe usar corretamente. Como resultado da propaganda e do desconhecimento se transformou numa espécie de lâmpada de Aladdin para realizar sonhos.


Sendo promovida e vendida por quem conhece como funciona, é comprada por quem quer ter algo já, porque acredita que merece. Na maioria das vezes, o comprador somente foca naquilo que quer, transformando o crédito numa grande armadilha.



QUEM ENGANA QUEM?


Quem vende o crédito poderia oferecer maiores informações sobre os riscos do endividamento. Também, deveria colocar um rótulo parecido ao de “BEBA COM MODERAÇÃO”, que aparece quando se oferecem bebidas alcoólicas, ou as advertências nos maços de cigarros.


Porém, quem decide utilizar o crédito também deveria se informar melhor sobre esses riscos e, principalmente, sobre o impacto de uma nova parcela no seu orçamento mensal. Não adianta procurar “responsáveis externos” quando, na hora de resolver utilizar a ferramenta chamada crédito, não foram avaliados os custos e benefícios dessa decisão.


COMO EVITAR A ARMADILHA?


- Antes de decidir uma compra, se questione: quero ou preciso?


- Antes de fazer a compra, se questione: preciso comprar já ou posso me programar para comprar à vista e com desconto?


- Se não tiver os recursos necessários para comprar agora: pode juntar o dinheiro ao longo de um período e assim comprar à vista e com desconto.


- Se precisa comprar já e não tem todo o dinheiro:

  • Pode dar uma entrada e parcelar a diferença?

  • O valor da nova parcela, irá desequilibrar o orçamento nos meses em que deva ser paga?

  • O prazo durante o qual a parcela será paga, supera a vida útil do bem o serviço comprado? Se sim, melhor repensar esse prazo! O prazo do pagamento não deve ultrapassar a vida útil do que comprou!

  • Analisou e entendeu o contrato de empréstimo? Saiba que até quando utiliza o cartão de crédito deveria conhecer as “regras do jogo”.

  • Existe uma reserva para imprevistos? Em caso de uma diminuição na renda mensal ou aparecer uma despesa emergencial, o financiamento deve ser respeitado. Sem reserva, o risco de não poder honrar as parcelas contratadas é muito elevado.

O crédito se transformou numa terrível armadilha financeira porque é utilizado de forma incorreta. Avaliar a real necessidade de utilizá-lo, conhecer e compreender as regras do empréstimo, assim como verificar se existem condições financeiras para pagar depende de quem irá utilizá-lo.


Procurar outros culpados não resolverá a situação e correr atrás de um novo crédito para pagar o anterior, sem identificar uma solução definitiva, somente irá piorar a situação.


[1] Os riscos e benefícios da utilização do crédito são abordados no artigo publicado no Blog do BEM: Está preparado para usar o crédito? (https://bit.ly/post_credito).


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Silvio Bianchi é Contador Público, Pós-graduado em Educação e Coaching Financeiro, Master Coach, Coach Executivo e de Carreira, Coach Financeiro, Treinador e Palestrante. Cofundador de Bem Financeiro – Desenvolvimento em Finanças, é responsável pelo escritório em São José dos Campos (SP).

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